sábado, 16 de janeiro de 2010

Crónicas de uma rapariga gira [2ª série] 2ª

Nos dias de chuva, enquanto chove, com a água a bater lá fora na rua, fico a pensar naquilo de que não quero separar-me.

Li ínumeras vezes que era preciso saber perder, porque inevitavelmente, ao longo da vida separámo-nos de coisas e pessoas de que gostamos e que pensamos que pertencem para sempre ao nosso quotidiano. Apesar de saber disso, nunca me convenci dessa verdade e, tentei sempre acumular tudo, para não perder, nada. Não me convenço que o caminho se faz com umas pessoas que acabam por parar numa paragem de autocarro, para seguirem outra linha. Quando isso acontece, sinto-me abandonada. Sinto que falhei com essa pessoa, porque não a mantive ao meu lado. Essencialmente, não suporto a ideia de perder a minha vida com essa pessoa.

É claro que também sofro quando perco coisas, rotinas ou trabalhos, mas o que mais me custa é perder pessoas. Deixá-las seguir a vida ou a morte delas sem mim. Quando isso acontece, tendo a ficar agarrada à memória de como era a minha vida quando essa pessoa fazia parte delas e, choro, como se a dor me mantivesse presa a quem perdi.

Tenho pensado muito sobre isto, porque parece-me que se é inevitável ter de deixar as pessoas seguirem a sua linha, vale mais aprender a não querer ficar a segurar isso por fios imaginários que me fazem não seguir a minha própria linha. Faz-me só ficar só, sentada a ver passar os autocarros e sem me decidir a apanhar nenhum. Pode ficar-se com as memórias, desde que estas não turvem a olhos a ponto de não saber para onde queremos ir. Para evitar isso, as memórias devem ter um pedacinho muito pequenino da nossa vida.

Estas ideias perseguem-me como cada raio de sol ou como cada gota de chuva destes últimos dias. Quero aprender a seguir a minha linha mesmo quando sofro perdas irremediáveis e dolorosas. Existem tantas pessoas no mundo que seguem a mesma linha que eu posso escolher, que é inútil ficar parado a pensar em quem escolheu outra.

O meu "Mr. Big" está noutra linha. Após tantos anos a esforçar-me por tentar seguir no mesmo sentido, percebi que íamos para lados opostos. Tentei ajustar-me. Fazer compassos de espera ao meu próprio sentido, só para poder seguir a seu lado. Custou-me muito tomar a decisão de parar na paragem e esperar pelo autocarro que queria entrar. Custou-me olhar para trás e dizer-lhe adeus, de tal forma que de vez em quando até penso que me enganei na linha e, que tenho de voltar para trás, para o local onde já fui feliz. A verdade é que, se me enganei foi em pensar que podia alterar o sentido das coisas. Para mim, sentir amor, sentir amizade, sentir-me fisicamente atraída, são factores que me fazem querer estar com uma pessoa, tê-la ao meu lado, fazer planos com ela, partilhar a minha existência na maioria dos momento. Por ele, eu senti isso. Ele era não só o meu melhor amigo, como também era quem eu queria como companheiro de viagem. Para ele, eu era a melhor amiga, com quem cometeu o erro de se envolver fisicamente apenas por se sentir atraído. São duas linhas de pensamento diferentes. Não nos faziam seguir no mesmo sentido. Fazia-me sofrer porque ele nunca era o companheiro que eu queria e, faziam-no sofrer, porque eu nunca era só amiga e cobrava-lhe o que queria. Nos filmes, os "Mr. Big" apercebem-se, bem no final, que não conseguem viver sem aquela mulher que sempre amaram. Na vida real, um deles ou dois acabam por pôr fim e afastam-se, cada um para a sua linha de pensamento.

Sou agora um vulto no autocarro, que já não vê o lugar onde foi feliz, mas com os olhos turvos de água, sem conseguir ainda ver a beleza do caminho que de certeza esconde segredos tão admiráveis, como aquela pessoa que acabou por ser fiel ao caminho que sempre disse querer.

Não posso realmente mudar o rumo dos outros, mas sou responsável por fazer os possíveis por seguir o meu. Afaste-me ele, de quem me afastar.



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